Miss in Scene | Alien, o Oitavo Passageiro

 

Talvez seja uma situação familiar. O momento em que uma mulher se sente ignorada em uma reunião masculina. Ela quer fazer parte, tem boas ideias, mas é automaticamente ejetada da conversa. Ellen Ripley é uma pessoa que luta para ser ouvida em um mundo irracional, dominado por homens. O filme é Alien, o Oitavo Passageiro. O diretor é Ridley Scott. O ano é 1979. Sigourney Weaver entrega uma performance icônica, se tornando uma das primeiras heroínas de ficção científica na história do cinema.

Originalmente criado para ser um personagem masculino, Ripley poderia ter sido inserida no elenco para ser a sex symbol da equipe; estamos falando da obra de Ridley Scott, onde o conceito é mais profundo do que se imagina. À primeira vista, o corpo franzino e esguio da jovem, parece entregar a persona de uma moça vulnerável dentro da tripulação. Em vez disso, ela é a sisuda que franze a testa e toma decisões com uma determinação invejável. É a própria Ripley quem pensa de forma coerente quando recusa a entrada dos colegas que, embora não saibam, estão trazendo um novo coleguinha a bordo.

Há outra mulher na equipe do Nostromo. É Joan Lambert (Veronica Cartwright), mas ela parece a antítese dos valores feministas de Ripley. Enquanto a primeira se mantém firme diante da ameaça, a outra grita, chora, só faz fiasco, e não se permite agir de forma sensata. Talvez essa discrepância exista para gerar contraste e marcar a importância da presença de Ripley no grupo.

Em síntese, o contexto de horror em que a personagem está inserida possui ares de política sexual, quando dialoga deliberadamente sobre os medos masculinos em relação à reprodução feminina. A maternidade está presente na construção narrativa. A nave, em seu núcleo, é escura, úmida, um emaranhado de cabos que mais parecem vísceras. O sangrento espetáculo do “parto”. O alienígena com dois disfarces: Fálico e vaginal (Freud explica). A inteligência artificial chamada de “Mãe”. E no centro do palco, na visceralidade do gênero, a jovem Ripley figurando algo de instintivo, buscando liderança e sobrevivência. E como se não bastasse, além de todo esse leque de representações femininas e feministas, ela ainda vai ao resgate do gato. (Instinto materno?) Como já disse uma vez o poeta: “Que mulher!”

Ripley alien

Quantas vezes alguém da tripulação se ferrou por não dar ouvidos a Ripley? Todas. Parece que ela, Parker e o gato, eram as únicas criaturas sensatas daquele navio espacial. Que o diga o capitão Dallas, que quis bancar o macho alfa e acabou como um vegetal gosmento. (perdão pelos spoilers, mas esse filme já foi lançado há mais de trinta anos).

Uma Miss in Scene também comete erros, mas, em parte, esse último não cai inteiramente sobre os ombros de Sigourney: uma personagem tão aguerrida, única sobrevivente de um massacre espacial, fica seminua no derradeiro final? É uma sequência estranhamente gratuita. A impressão que fica é de que a equipe do filme ficou tão alarmada com tudo o que haviam desencadeado, que tentaram controlar a personagem no último minuto. Teria Ridley Scott se rendido a uma cena clichê ou existe uma mensagem mais profunda escondida? Nunca saberemos.

Ripley alien

A verdade é que a cena esquisita não tira o brilho da personagem, que é um marco na história do cinema. Muitas personas femininas foram, e ainda são, inspiradas na figura de Ellen Ripley, que, além de ter sido a única que viveu para contar a história, ainda comandou as três sequências da franquia! Uma inspiração para que meninas, moças e mulheres se sintam representadas através de uma personagem forte, e certas de que podem e devem ser ouvidas.  Tranquila no comando da nave, com o gato no colo, fazendo o estilo Don Corleone, nossa heroína encerra o filme, e agora esse texto: “(…) devo chegar à fronteira em aproximadamente seis semanas. Com um pouco de sorte, a rede me resgatará. Aqui é Ripley, a última sobrevivente do Nostromo, encerrando a transmissão.”

 

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Elaine Timm

Elaine é gaúcha, formada em Jornalismo, atua como social media e curte freelas. Blogueira de várzea, arrisca escritas diversas. Cinéfila, amante dos livros, musical e nerd desde criança, quer ser Jedi, mas ainda é Padawan. Save Ferris.

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One thought on “Miss in Scene | Alien, o Oitavo Passageiro

  • 31 de março de 2019 at 09:45
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    Na verdade, a cena não é gratuita. É para mostrar que mesmo na sua condição de mulher forte, ela tem momentos em que pode estar fragilizada e precisa estar sempre alerta. Quando ela veste o traje espacial, é como se ela se revestisse novamente de seu poder feminino para enfrentar as ameaças.

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