Persona | Tom Hansen – (500) Dias Com Ela

 

Esta é a história do garoto que conhece a garota. Mas você deve saber que não é uma história de amor.

Em apenas 2 minutos somos introduzidos aos dois protagonistas que iremos acompanhar. O romantismo incondicional do garoto e o desapego da garota como contrapontos para uma relação fadada ao término, mesmo com um título que já provoca ao espectador essa sensação.

Desde o começo, Tom Hansen (interpretado por Joseph Gordon-Levitt) é colocado, a maioria das vezes, no lado esquerdo da tela; já Summer Finn (Zooey Deschanel) é posta, logicamente, no lado direito da imagem, para representar esse abismo de personalidades. Essa ideia ganha seu propósito na famosa cena entre expectativa e realidade: o lado esquerdo significando a expectativa — podendo também a lógica estar relacionada com o coração, para retratar o viés sentimental —, enquanto Summer é a dolorosa realidade.

Tom

A própria essência do personagem masculino também é visualizada por meio de suas camisas do Joy Division (com uma tendo até a frase da icônica música “Love Will Tear Us Apart”), a idolatria por The Smiths e outras tantas influências que o fazem acreditar nessa sabedoria convencional do que é amor, somado com a má interpretação do filme A Primeira Noite de um Homem.

É sintomático vermos o choro de Summer (ao som da canção “Bookends” da dupla Simon e Garfunkel) ao presenciar o final da obra de 1967, por compreender que manter tal relação é incabível por diversos motivos — e mais revelador ainda é notar a completa confusão de Tom com tal fato.

Tom

Mesmo acreditando em amor verdadeiro e alma gêmea, o personagem principal demonstra-se imaturo desde o princípio por várias causas, incluindo a insistência em ter algo mais concreto com uma pessoa que claramente não se sente tão confortável com aquilo. Com a idealização do romance que teve com Summer, a consequente decepção é nada menos que natural, já que a mesma (desde sempre) falava que não queria nada sério. O diálogo de seu amigo é certeiro ao afirmar que a mulher dos sonhos é inferior por justamente não ter qualquer resquício com o real.

Visualmente, a direção aliada com a fotografia consegue exibir essa falta de sintonia entre o casal. Embora não tenha a genial eficiência de cores de La La Land: Cantando as Estações, o filme discerne os dois através delas. A cena logo após a primeira relação sexual é um exemplo, na qual Tom (com cores sempre amenas) está rodeado por personagens vestindo figurinos com várias tonalidades de azul (cor que sua amada utiliza com bastante frequência), mas o mesmo parece deslocado nesse aspecto — ainda que sua felicidade o torne embriagado e iludido com tudo que se refere ao seu próprio romance.

Tom

A própria estrutura temporal não-linear faz com que a complexidade emocional e a cegueira de Tom sejam evidenciadas com o fato de procurar por sinais para o que deu errado em sua relação amorosa. E, apesar do roteiro mostrar a cena do término, é bastante coerente não revelar um momento específico para entregar a resposta que ele tanto procura: sentimentos não são corpóreos e facilmente explicáveis.

Toda essa confusão e tristeza são reforçadas também com as belas homenagens a obras-primas como Quando Duas Mulheres Pecam e O Sétimo Selo (ambos do gênio sueco Ingmar Bergman) para expressar a intensa crise emocional que o protagonista está envolvido.

 

Só porque uma garota bonita gosta das mesmas coisas bizarras que você, isso não a torna sua alma gêmea.

Já em seu final, no casual encontro com sua ex-namorada, a lógica do mise-en-scène é invertida (que também é aplicada quando os dois se encontram nesse mesmo local no começo de tudo) para simbolizar essa realidade caindo nos ombros infelizes de Tom — chegando ao ponto extremo, mas momentâneo, de não acreditar mais em qualquer uma de suas idealizações amorosas.

Tom

Por mais que alguns ainda interpretem erroneamente que Summer é uma “vadia” (termo usado dentro da própria película que prova a imaturidade do protagonista), a mesma, através dessa conversa no terceiro ato, mostra-se amigável para manifestar que cada relação se leva um aprendizado. A miséria de Tom faz com que ele parta para novos objetivos profissionais e, com a cena já mencionada, compreende que existe um elemento enigmático que faz com que as pessoas acabem ficando com umas e não outras. Tanto que Summer, aquela mulher incrédula e cínica sobre todos os conceitos que o protagonista acreditava, está casada e com uma certeza que nunca teve em seu relacionamento anterior e (provavelmente) em qualquer outro.

A analogia disso com diálogos como “Não existe isso de amor, é fantasia” e “Acho que você saberá quando sentir” (proferidos pelos dois no começo da obra) só escancaram a irracionalidade dos mais profundos sentimentos e a flexibilidade de nossos credos pelas próprias experiências vividas, sejam elas saudáveis ou traumáticas, nos moldando, de maneira gradual, para os eventos futuros.

Com isso, na última cena, temos um Tom cético e dissecado por meio de frases através do narrador. Ainda com tudo que lhe ocorreu, o mesmo tem, de certa forma, um final feliz ao encontrar uma garota com outro nome de estação para descobrir que, no fim das contas, toda relação tem sua parcela de coincidências e, consequentemente, mistérios.

E assim vamos vivendo, esperando que a outra pessoa consiga lidar com nossas qualidades e (o mais importante) defeitos.

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Jonatas Rueda

Capixaba, formado em Direito e cinéfilo desde pequeno. Ama literatura e apenas vê séries quando acha que vale muito a pena. Além do cinema, também é movido à música, sendo que em suas playlists nunca podem faltar The Beatles, Bob Dylan, Eric Clapton e Led Zeppelin.

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