Operação Final | Análise

O período do Nazismo e do Holocausto e suas consequências já foram retratados diversas vezes no cinema. Algumas histórias, no entanto, não encontram tanto destaque para um público mais abrangente — filmes para a TV ou produções menores, que perduram pouco além da passagem por festivais. É o caso da captura de Adolf Eichmann, tema que já havia sido abordado pelo menos outras 4 vezes em longas-metragens, e é o plot de Operação Final, que chegou no início de outubro na Netflix.

Eichmann, vivido por Ben Kingsley no filme, era o responsável pelo “Gabinete de Assuntos Judaicos” durante o governo de Hitler e foi um dos autores da Solução Final, que levou mais de 6 milhões de judeus à morte. Em 1960, chega à Mossad, o Serviço de Inteligência de Israel, a informação de que o algoz daquele povo estaria morando em uma propriedade nos arredores de Buenos Aires, como um cidadão comum, sob o nome de Ricardo Klement.

A ideia é tirar Eichmann vivo da Argentina e levá-lo a julgamento em Israel, já que ele escapou de ser julgado em Nuremberg como os demais membros da SS que sobreviveram. Não seria fácil, porém, já que o plano implica em burlar a soberania argentina, infiltrando agentes da Mossad no país.

O filme segue um ritmo que se assemelha com o de séries de TV (e não, ele não é uma produção original da Netflix; o serviço streaming tem apenas os direitos de distribuição no resto do mundo. Nos EUA, o longa foi para os cinemas), pela forma como apresenta seus diversos personagens e os coloca, aos poucos, no mesmo cerco.

É uma pena que, apesar de introduzir uma variedade de personas, uma vez que a trama principal se desenha, o destino e ações de outros personagens, como Sylvia (Haley Lu Richardson) ou Klaus (Joe Alwyn), sejam quase esquecidos ou relegados a cenas breves, que quase não dizem coisa alguma. Até mesmo no final, os únicos que têm seus destinos revelados ao público são Eichmann e o seu captor direto, o agente Peter Malkin (Oscar Isaac).

Aliás, esse não é o único pecado de Operação Final. Com créditos iniciais bem produzidos e uma cena da confecção dos passaportes para os agentes da Mossad seguindo a mesma linha visual, o longa tem ainda uma passagem com jogos de câmera bem sagazes, que imergem o espectador no clima de espionagem. O problema é que tais recursos também parecem ser completamente abandonados após certa altura da fita. O resultado final é um filme meio sem identidade visual.

O diretor, Chris Weitz, optou por não dar á obra um tom tão sombrio, como é comum no tratamento do tema, embora seus personagens, obviamente, sejam o tempo todo assombrados pela guerra e pela perda de pessoas queridas. As imagens de Peter sobre a irmã são as partes que adquirem mais peso em relação aos horrores do Holocausto, e vão ficando mais pesadas a cada vez que aparecem. Uma lembrança do próprio Eichmann sobre a execução de centenas de judeus também causa arrepios.

Apesar de tudo isso, Operação Final está (muito) longe de ser uma bomba. Além da bela trilha, as ótimas atuações de Isaac e Greg Hill até podem nos fazer perdoar uma Mélanie Laurent mal aproveitada, mas, ainda assim, competente. Mas quem rouba mesmo a cena é Kingsley, na pele de um personagem que vive para e através de sua retórica. Eichmann era um homem que não via pessoas, somente números, e que se defendia dizendo que nunca deu ordem nenhuma, apenas “cuidava da papelada”. Um burocrata que acha que pode se eximir da culpa por não ter puxado um gatilho ou ligado as câmaras de gás.

Todo esse jogo de palavras rende diálogos interessantes entre o vilão histórico e alguns de seus captores, em especial Peter. De início, pode parecer que o filme não quer julgar o homem que exibe até ares de “cão arrependido”. Mas é só lembrarmos que a face real de Adolf Eichmann foi construída para o espectador minutos antes, através do comportamento de seu filho Klaus, que obviamente não aprendeu a odiar os judeus e apoiar o nazismo do nada. Essa é uma das escolhas mais acertadas do filme: mexer com a expectativa do público e trabalhar esses personagens em conjunto.

Histórias sobre os horrores da guerra e pós-guerra precisam ser contadas e compreendidas para que jamais voltem a se repetir. Operação Final pode não ser o filme que o tema merece, mas tem qualidade, e certamente ajudará para que uma quantidade maior de pessoas conheça mais esse personagem que causou tantos danos e terror à história do mundo.

Uma pequena observação…

O ano de 1960 marcava o 150º aniversário da independência argentina. As ruas estavam tomadas por bloqueios policiais e, em uma cena onde dois agentes da Mossad passam por um desses bloqueios, o diálogo entre eles torna impossível não pensar no nosso próprio momento político atual. Tudo começa quando um deles fala sobre a tentativa de proteger a democracia. E a conversa segue:

– Do que eles têm tanto medo?

– Comunas. Judeus. Nacionalistas, peronistas. Depende a quem você pergunta.

Nota: ★★★☆☆

Ficha Técnica

Operation Finale

Ano: 2018

Direção: Chris Weitz

Roteiro: Matthew Orton

Elenco: Ben Kingsley, Oscar Isaac, Mélanie Laurent, Nick Kroll, Joe Alwyn, Haley Lu Richardson, Lior Raz, Ohad Knoller, Greg Hill

Fotografia: Javier Aguirresarobe

Montagem: Pamela Martin

Trilha sonora: Alexandre Desplat

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Roseana Marinho

Roseana é publicitária e acha que os dias deveriam ter pelo menos 30h para trabalhar e ainda poder ver todos os filmes e séries que deseja. Não consegue parar de comprar livros ou largar o chocolate. Tem um lado meio nerd e outro meio bailarina.

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