Horrorscópio | Apóstolo

 

Gareth Evans é importante para o gênero de ação no cinema. O galês, admirador da arte marcial indonésia Silat, reconheceu o talento de Iko Uwais e o revelou ao mundo com o filme Merantau. Mas foi com Operação Invasão que Uwais e Evans sacudiram a indústria, com suas brutais sequências de ação, lutas sangrentas e que se tornaram muito influentes. Operação Invasão 2 aumentou tudo em relação ao seu antecessor: mais violento e com uma duração maior, um verdadeiro épico das artes marciais e dito por muitos como o melhor filme de ação da década. Não só Uwais ganhou mais renome, como também outros atores indonésios ganharam muito reconhecimento para o gênero, como Yayan Ruhian e Julie Estelle (para perceber a influência, Uwais e Ruhian ganharam uma participação especial em Star Wars: O Despertar da Força).

Eis que chegamos a Apóstolo, novo longa de Evans e filme original Netflix, disponível na grade de programação do canal. Após o diretor realizar a façanha de criar duas obras tão contundentes no cinema de ação, ele não queria ficar conhecido apenas por um gênero. Queria evoluir como diretor, ir por outros caminhos. Surgiu o convite para dirigir o segmento Safe Haven, da antologia de terror V/H/S 2. Co-dirigido com o amigo Timo Tjahjanto — diretor que de certa forma segue os passos de Evans no cinema de ação/horror e é o responsável pelo brutal The Night Comes for Us, que estreia na Netflix esse mês — Safe Haven é uma pérola, com muita brutalidade e já indicava um talento de Evans também para o gênero horror.

Apóstolo pega emprestado apenas a ideia de Safe Haven de um culto misterioso, mas é algo diferente. O longa se passa em 1905 e inicia com um traveling elegante e não demora para apresentar a trama: Dan Stevens é Thomas Richardson, um perturbado homem que recebe a missão de resgatar a irmã Jennifer (Elen Rhys), que fora raptada por um culto localizado na misteriosa ilha de Erisden. De família rica, Thomas resolve se infiltrar no culto como se fosse um novo membro e, aos poucos, tenta localizar a parente, enquanto presencia estranhos eventos no local.

O diretor e também roteirista não se preocupa em antecipar eventos, trabalha sua trama de maneira cadenciada, apresentando bem seus personagens e a realidade daquela ilha. Michael Sheen é o profeta Malcolm, líder daquela seita e que comanda tudo junto a Frank (Paul Higgins) e Quinn (Mark Lewis Jones). Ffion (Kristina Froseth), filha de Quinn, tem um caso escondido com Jeremy (Bill Milner), filho de Frank. E Andrea (Lucy Boynton), filha de Malcolm, se interessa muito por Thomas, recém-chegado à ilha. Esses personagens se cruzam durante toda a trama, o diretor desenvolve bem o mistério que cerca a ilha tudo no tom certo, com forte influência do clássico filme O Homem de Palha.

A excelente trilha sonora composta por Aria Prayogi e Fajar Yuskemal adiciona elementos orientais em seus instrumentos e percussão, os quais evidenciam toda a aura mística e ancestral. A música dita o ritmo: quando a tensão é crescente, os acordes aumentam gradativamente e assim sucessivamente. Matt Flannery, habitual colaborador de Evans como diretor de fotografia, cria um trabalho magnífico de profundidade ao se distanciar da ilha e focar as lindas paisagens onde se passa o filme.

O tom sobrenatural é presente de forma sutil, mas muito bem introduzido e que faz todo o sentido ao título do filme. O seu lento desenrolar gera um terceiro ato extremamente tenso e violento, em que Evans mostra toda a experiência adquirida em seus filmes anteriores. O elenco todo está bem, nos preocupamos com o destino dos personagens. Stevens cria um protagonista de passado duvidoso, as cicatrizes em suas costas e o vício em drogas mostram que é uma pessoa atormentada e o ator sabe transparecer isso muito bem. Michael Sheen cria um antagonista que também tem o seu propósito, não é apenas um líder religioso cruel e insano; tudo ali, naquela ilha, é administrado.

Apóstolo é um acerto da Netflix, que ultimamente parece ter aprendido com os erros de seus filmes originais e está investindo muito em longas de festivais e na qualidade não só das suas séries. E mais um acerto de Evans na direção de um gênero diferente. Com pouca ação e um horror bem construído, é um trabalho admirável desse diretor que já não precisa provar o quanto é talentoso.

 

Nota: ★★★★

Ficha Técnica

Apóstolo (Apostle)

Direção: Gareth Evans

Roteiro: Gareth Evans

Elenco: Dan Stevens, Kristine Froseth, Lucy Boynton, Michael Sheen, Bill Milner, Mark Lewis Jones, Paul Higgins, Elen Rhys.

Fotografia: Matt Flanery

Música: Aria Prayogi e Fajar Yuskemal

 

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Ibertson Medeiros

Graduado em Direito, sempre quis trabalhar de alguma forma com cinema, pois é uma paixão desde a infância. Cearense, fã dos anos 1970, curte o bom e velho Rock ‘n Roll e um cinema mais alternativo e underground, sem tirar os olhos das novidades cinematográficas.

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