Poltrona Pipoca | Millenium: A Garota na Teia de Aranha
Após a trilogia sueca que adaptou os três primeiros livros do escritor Stieg Larsson, David Fincher recebeu a missão de adaptar Os Homens que Não Amavam as Mulheres, um remake para Hollywood. O excelente filme, lançado em 2011, deixou os fãs dos livros ansiosos por uma continuação, o que infelizmente nunca aconteceu. Até que Fede Alvarez assumiu o projeto, não de uma continuação, mas para adaptar o quarto livro: Millenium: A Garota na Teia de Aranha, o primeiro da série que não foi escrito por Larsson.
Com um elenco completamente diferente do filme de Fincher, Alvarez fez questão de não fazer ligações com a obra anterior, utilizando de uma identidade própria e menos impactante visualmente. A violência aqui é branda, o que torna a obra mais superficial; a violência sexual da qual Lisbeth (Claire Foy) sempre foi cercada é sugestiva, tendo pouco espaço no roteiro.
O roteiro em si é o grande problema dessa adaptação: a trama principal aborda Lisbeth sendo contratada para recuperar um programa de computador que é capaz de controlar qualquer arma nuclear do planeta; uma subtrama sobre seu passado familiar, como um típico clichê que se será resolvido no ultimo ato. Enquanto a obra acompanha a personagem tentando recuperar o programa para o governo, o filme funciona bem, como a trama de espionagem e em suas cenas de perseguição. Onde a obra começa a perder força é exatamente quando tudo se entrelaça.
Provavelmente, para quem leu os livros (o que não é o meu caso), tudo pode fazer sentido. Mas, não me desceu todo o drama familiar o qual envolve a irmã de Lisbeth e seu passado abusivo com o pai, me soando genérico e superficial. Nunca nos aprofundamos naquela história, o máximo que nos é entregue são sonhos, rápidos flashbacks e diálogos sem profundidade no desenvolvimento do arco. As soluções fáceis do roteiro também incomodam: durante o terceiro ato, principalmente, quando um personagem com rifle aparece quase como um deus ex machina, livrando a protagonista de todos os obstáculos os quais enfrentaria.
O excesso de personagens que estão no filme “apenas por estar”, também enfraquecem a narrativa. Em certos momentos, ficamos confusos com quem é quem e de onde alguns deles saíram. Sverrir Gudnason, que aqui dá vida ao jornalista Mikael Blomkvist, não entrega bem o papel — em quase todas suas cenas aparece apático e sem motivação para aquele trabalho. Com certeza, uma reduzida nos personagens faria bem à obra, já que alguns não trocam mais do que quatro linhas de diálogos durante todo o filme e só foram colocados ali para uma tentativa frustrada de plot twist.
O filme também acerta em diversos pontos, a fotografia é excelente, utilizando de cores mais acinzentadas, transmitindo uma certa frieza da qual a protagonista tem que abraçar e a crueldade de alguns atos que tem que exercer. Toda a ambientação — explorando Oslo como uma cidade sem alma, onde pode-se se esconder de seu passado —, é bem-feita.
A trilha sonora é um complemento para a imersão tensa que a fotografia cria, com uma música tocada com violinos, utilizando de notas que nos dão a sonoridade mais arrastada, ajudando na dramaticidade e criando um certo desconforto, exibindo como nossa protagonista se sente em diversos momentos.
Millenium: A Garota na Teia de Aranha vai muito bem tecnicamente falando, levando o público para dentro de suas cenas com sua musicalidade e com o carisma de sua protagonista, mas perde força com um roteiro cheio de soluções fáceis e uma subtrama que não funciona em seu apelo dramático — pelo menos não para quem não leu os livros.
Nota: ★★★✰✰
Ficha Técnica
Direção: Fede Alvarez
Roteiro: Jay Basu, Fede Alvarez, Steven Knight
Elenco: Claire Foy, Sylvia Hoeks, Lakeith Stanfield, Stephen Merchant, Cameron Britton, Vicky Krieps, Sverrir Gudnason, Andreja Pejic, Christopher Convery
Fotografia: Pedro Luque
Trilha Sonora: Roque Baños
Montagem: Tatiana S. Riegel
Direção de Arte: Susannah Brough, Daniel Chour, Sabine Engelberg, Tarnia Nicol, Denis Schnegg