Brazuca | Benzinho

 

Benzinho é o segundo longa-metragem do diretor Gustavo Pizzi, em mais uma parceria com a atriz e ex-esposa Karine Teles, que foi a protagonista e corroteirista de Riscado, debut na mesma categoria cinematográfica e agora desse novo trabalho. Em uma ironia que demonstra o descaso que o cinema brasileiro recebe em próprio terreno, o filme teve sua estreia no Festival de Sundance no início de 2018, ou seja, em outro país que não o nosso e, depois de meses, chega aos cinemas brasileiros. Diretores daqui investem seus talentos em festivais mundo afora, muitas vezes. Berlim, Veneza, Sundance, Cannes, o cinema brasileiro é exportado para “gringo” ver e nós temos, muitas vezes, difícil acesso para apreciar essas obras.

Desabafos à parte, o filme sutilmente retrata a sociedade brasileira em tempos de crise, não só cultural, mas financeira. É um retrato fiel de uma família de classe média não só de Petrópolis, Rio de Janeiro, mas de todo o Brasil. Apesar das dificuldades, o amor familiar é a força adicional para superar as barreiras.

Karine Teles interpreta Irene, uma mãe amorosa que trabalha vendendo roupas de fornecedores, tenta dar atenção aos 4 filhos e ao marido, enquanto vivencia o drama da irmã Sônia (Adriana Esteves) e tenta se formar no ensino médio a plenos esforços. O convite dado a Fernando (Konstantinos Sarris), filho mais velho e jogador de handball, por uma escola alemã para que ele more e treine na Alemanha, modifica a rotina da família.

Aos poucos, vamos adentrando no seio familiar e conhecendo os outros membros: Rodrigo (Luan Teles), o filho do meio, músico na banda da cidade que anda por todo canto com uma tuba, seu instrumento; o marido Klaus (Otávio Müller), dono de uma pequena livraria em iminente falência; e os caçulas gêmeos, Fabiano e Matheus (Arthur Teles Pizzi e Francisco Teles Pizzi, filhos do diretor com Karine). Além deles, a já citada irmã Sônia, que vive um drama recente de separação e é perseguida pelo ex-marido Alan (César Troncoso), usuário de drogas e de temperamento violento.

Benzinho foca em pessoas comuns, numa cidade interiorana, mas que reflete a crise que o país passa. Em determinado momento, Klaus comenta que os proprietários de livrarias, assim como ele, estão passando por dificuldades, o público prefere livros comprados pela internet e não vão mais a lojas físicas e isso é um dos reflexos da realidade — grandes redes de livraria no país estão em processo de recuperação judicial. A adaptação de uma família a novos momentos, sem desistência fácil, é um dos motes do filme. A tentativa de Irene em educar-se; a busca por novas alternativas financeiras que Klaus almeja; o jovem que tenta seguir seu sonho, com todas as burocracias que possa existir.

A câmera de Gustavo Pizzi é ágil: em determinados momentos segue os jogadores de um lado ao outro em uma partida fluída de handebol; em outra sequência, acompanhamos um desfile da banda da cidade pelas ruas, em um misto de simplicidade com virtuosismo.

As atuações são corretas e o maior destaque é mesmo de Karine Teles. Sua personagem é vivaz, despida de uma máscara de artificialidade, esbanja espontaneidade e é facil o espectador se afeiçoar a ela. Os desejos iniciais da mãe em não se distanciar do filho, do seu benzinho, dão lugar para a aceitação. A despedida é dura, apesar de tentarmos ser fortes. Adriana Esteves tem um papel pequeno, que não tem relevância alguma à trama. O drama dela não nos causa tanta comoção assim e contribui a caricata atuação do uruguaio César Troncoso para que esse núcleo da história torne-se desinteressante.

A própria jornada de Fernando não é tão bem explorada. Para o jovem, todo o percurso aparenta ser fácil, não vemos muitos conflitos internos no personagem, nem perante a família ou o time do colégio. Mateus Solano tem uma rápida participação como o treinador, mas numa sequência que beira o risível e irrelevante.

Benzinho é um filme que conquistou crítica e público por sua simplicidade. Tão simples que joga certos temas ao ar, mas não os desenvolve bem, o que é uma pena. No entanto, possui uma beleza digna do cuidado e de um coração de mãe: a personagem Irene é a verdadeira força motriz do longa, quando ela não está em foco, o filme não encanta tanto. É tímido ao tentar mencionar temas mais espinhosos e fica apenas na zona de conforto.

Nota:  ★★★✰✰

 

 

Ficha Técnica

Benzinho (Loveling)

Ano: 2018

Direção: Gustavo Pizzi

Elenco: Karine Teles, Mateus Solano, Adriana Esteves, Otávio Müller, Konstantinos Sarris, Luan Teles, Arthur Teles Pizzi, Francisco Teles Pizzi.

Roteiro: Gustavo Pizzi e Karine Teles.

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Ibertson Medeiros

Graduado em Direito, sempre quis trabalhar de alguma forma com cinema, pois é uma paixão desde a infância. Cearense, fã dos anos 1970, curte o bom e velho Rock ‘n Roll e um cinema mais alternativo e underground, sem tirar os olhos das novidades cinematográficas.

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