Persona | Rob Gordon (Alta Fidelidade)

 

“O que veio primeiro: a música ou a infelicidade? Eu escutava música pop porque era infeliz ou era infeliz por escutar música pop?”

Rob Gordon (John Cusack no que muitos consideram a melhor atuação de sua carreira) é um adulto no final dos vinte ou no começo dos 30 anos, fanático por música, dono de uma loja de vinil e que usa todo esse meio para expurgar seus “demônios” pessoais — sendo que a vertente é basicamente sobre suas decepções amorosas.

Alta Fidelidade já começa com o personagem principal presenciando sua atual namorada saindo de sua casa por motivos que ainda não sabemos. A quebra da quarta parede (com o intuito de se comunicar com o espectador) é feita de maneira orgânica e nos faz conhecer melhor sua personalidade, peculiaridades e opiniões.

Sua mania de fazer um top 5 de praticamente tudo, por exemplo, já é vista após o rompimento da relação amorosa: para desvalorizar a importância de Laura (Iben Hjejle), ela não consegue nem entrar na lista dos rompimentos que mais o arrasaram.

À medida que a obra vai se desenvolvendo, vemos que Rob, apesar da idade, é bastante imaturo no modo com que lida com suas companheiras. O mesmo, após descobrir que sua ex-namorada ainda não fez sexo com outro, faz o oposto ao se relacionar sexualmente com uma charmosa cantora. E para essa ideia de um menino no corpo de um homem ser concretizada, o vemos não lidando bem com a notícia de que ela, finalmente, fez sexo com outro.

Sua constante melancolia e tristeza (e o filme coloca boa parcela da “culpa” nos próprios discos em que ele está rodeado) pode ser notada também pelos seus figurinos; trajando, na maioria das vezes, camisas pretas e várias tonalidades escuras, além de uma jaqueta de couro da mesma cor.

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Sua infelicidade se estende com o fato de não estar realizado onde trabalha. Sua paixão é inegável (sua coleção de vinil é bem grande), porém, ele está nessa situação pelos sucessivos fracassos que teve na vida. Assim, o paralelo do insucesso tanto do aspecto profissional quanto do pessoal é elaborado de modo elegante e narrativamente coerente.

“Livros, álbuns, filmes… Essas coisas importam. Me chame de superficial, mas é a verdade.”

O crescimento emocional do protagonista em Alta Fidelidade (dirigido pelo britânico Stephen Frears) começa com sua própria desgraça. Com o intuito de compreender os motivos dos rompimentos mais dolorosos de sua vida, aos poucos vai tomando conhecimento de fatores que não era capaz de entender anos antes.

Se uma é por culpa totalmente dele (uma cegueira que durou anos) e outra por conta, segundo ele, do destino (já que ela está até hoje casada com esse homem), a mulher que considerava perfeita e de seus sonhos (interpretada por Catherine Zeta-Jones) não é nada do que ele imaginava em outra época. Logo, esse processo serve como uma catarse, ou seja, através dessa espécie de revivência e reanálise de seu passado, o faz entender melhor suas atitudes anteriores, como também as futuras.

E toda essa trama é permeada por referência de livros (o seu favorito é a autobiografia de nada menos que Johnny Cash), filmes (Uma Noite Alucinante 2) e, claro, músicas. Se vemos o pôster de gênios do jazz como Mile Davis e John Coltrane em sua casa, as menções a outro bandas e artistas consagradas como The Beatles, Nirvana, Bob Dylan, Elton John, Marvin Gaye e Art Garfunkel são frequentes. Sem contar que há uma participação especial de Bruce Springsteen.

No lugar de apenas serem referências aleatórias e sem propósito para história, essas três formas de arte (música, cinema e literatura) servem para aprofundar a psique não só do protagonista, como grande parte dos personagens coadjuvantes que parecem existir em função disso — incluindo aí o imperativo e hilário personagem de Jack Black.

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E encerrar com a canção de “I Believe (When I Fall In Love It Will Be Forever)”, de Stevie Wonder, só prova o cuidado dos realizadores de demonstrarem o típico e esperado final feliz de comédias românticas, mas agora em seu âmbito musical, já que a proposta, desde o começo, foi justamente essa.

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Jonatas Rueda

Capixaba, formado em Direito e cinéfilo desde pequeno. Ama literatura e apenas vê séries quando acha que vale muito a pena. Além do cinema, também é movido à música, sendo que em suas playlists nunca podem faltar The Beatles, Bob Dylan, Eric Clapton e Led Zeppelin.

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