Bang Bang | Os Brutos Também Amam

 

Logo na primeira cena, a obra já nos diz muito sobre nosso protagonista, Shane (Alan Ladd). Viajando em seu cavalo, com planos bem abertos, explorando ao máximo o formado de tela em widescreen — o que foi revolucionário pra época —, praticamente isola o personagem e o coloca quase como em um exílio.

Uma das coisas que George Stevens mais acertou na obra é desenvolver seus personagens, e na apresentação deles. Além da primeira cena que aparece, Shane em sua viagem, temos seu encontro com os demais personagens que estarão ao seu lado durante toda obra, a família Starret. Joey Starret (Brandon De Wilde) nos é apresentado observando o viajante de longe, um olhar curioso, mas ao mesmo tempo apreensivo. Isso é importantíssimo, já que cada vez mais seu fascínio por Shane só aumenta.

Os olhares de cada personagem aqui dizem muito sobre cada um; entendemos de cara que existe uma certa tensão sexual entre Shane e Marian Starrett (Jean Arthur), e um grande respeito com a amizade que se constrói entre ele e Joe Starrett (Van Heflin). Stevens não utiliza de close ups, ou de planos detalhe para atrair a atenção do público para os olhos, é tudo muito natural — ele quer que nós percebamos essa comunicação ocular de longe; pois, assim, tudo se torna mais crível.

A fotografia, como dita brevemente logo a cima, tem um papel fundamental. Podendo explorar mais espaços, Loyal Griggs faz de tudo para exibir o ambiente natural do estado do Wyoming. Mostrando pelo que os personagens lutam, por que vale tanto a pena tudo aquilo, que não é apenas ego — e sim, libertação.

O roteiro de A.B. Guthrie Jr. tem diálogos poderosos, como o que encerra o filme, e desenvolve a história de seus personagens dentro deles, sem soar muito explicativo. Utiliza de frases mais curtas que deixam tudo claro, principalmente sobre o passado sangrento de Shane. Ele também não faz questão de destacar quem são os mocinhos e os vilões, sem meio termo, mas nos fazem entender bem as motivações de cada um.

Rufus Ryker (Emile Meyer) e Jack Wilson (Jack Palance) são claramente os vilões principais e o roteiro só reforça o quanto são maus. Em um diálogo entre Rufus e Joe, fica clara todas suas motivações, o porque dele se achar dono das terras e que todos os outros têm a obrigação de servi-lo. É interessante imaginar pelo que aquele homem passou para conquista-las, quantos companheiros perdeu, como a vida o foi moldando para ser tão impiedoso. Já Jack, tem uma solução menos complexa e bem expressiva: ele está ali por dinheiro e segue como um “anti Shane”, sendo quase como uma versão maléfica do protagonista.

Shane, com seu passado cheio de dor e morte, tenta com todas suas forças se afastar daqueles dias tenebrosos; mas, a crueldade parece sempre o perseguir — o personagem passa quase todo o filme sem sua arma, isso mostra o quanto ele quer distância das mortes que já evidenciou e causou. Até suas vestes são trocadas, mas suas mãos não conseguem passar muito tempo limpas.

A música acompanha basicamente os sentimentos de Shane, quase todo o filme com uma pegada mais calma, com alguns momentos em um ritmo mais acelerado, quase dançante. Apenas no final, quando o protagonista recoloca suas vestes e põe sua arma na cintura, tudo muda para algo mais pesado e tenebroso — com o anoitecer, ele segue para seu fatídico destino, sem conseguir se livrar de toda matança que insiste lhe perseguir.

No final de tudo, Os Brutos Também Amam não é só mais uma obra com um mocinho que vai em busca de ajudar os fracos e desprotegidos; o filme fala sobre como o homem lida com a morte, muda e se corrompe através da violência; não importando estar certo ou errado, sendo do bem ou do mal, mas sim, mostrar como gerações diferentes absorvem essa cultura sangrenta, e que desde que nós matamos pela primeira vez, estamos fadados a seguir para sempre em nosso próprio exílio.

Nota: ★★★★★

 

 

Ficha Técnica

Direção: George Stevens

Roteiro: A.B. Guthrie Jr.

Elenco: Alan Ladd, Jean Arthur, Van Heflin, Brandon De Wilde, Jack Palance, Ben Johnson, Edgar Buchanan, Emile Meyer, Elisha Cook Jr., Douglas Spencer, John Dierkes

Fotografia: Loyal Griggs

Trilha Sonora: Victor Young

Montagem: William Hornbeck, Tom McAdoo

Direção de Arte: Hal Pereira, Walter H. Tyler

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Ítalo Passos

Cearense, estudante de marketing digital e crítico de cinema. Apaixonado por cinema oriental, Tolkien e ficção científica. Um samurai de Akira Kurosawa que venera o Kubrick. E eu não estou aqui pra contrariar o The Rock.

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