Sci-Fi | Minority Report – A Nova Lei

 

A força e magnitude do nome de Steven Spielberg é inegável. O diretor talvez seja o artista, por trás das câmeras, mais famoso da história, com algumas obras atemporais na carreira, como A Lista de Schindler. Seus trabalhos dentro do gênero da ficção científica também são memoráveis, dirigindo nada menos que Contatos Imediatos de Terceiro Grau, E.T.: O Extraterreste e Jurassic Park: Parque dos Dinossauros.

Portanto, a adaptação do conto de Philip K. Dick, escrito em 1956, foi uma investida lógica para o artista, já que sabia lidar com esse tipo de narrativa que envolve temas mais complexos através do extraordinário. A trama se passa no ano de 2054 e não existem mais crimes graças aos precogs (três indivíduos que preveem homicídios); porém, o chefe John Anderton (vivido pelo carismático Tom Cruise) descobre que ele é o próximo a cometer o crime.

Toda a essência da concepção, tanto do livro quanto do roteiro, se é mera coincidência ou não, condiz com a verdade estadunidense experienciada na década de 1950, onde o macarthismo era intenso e vigente. Várias pessoas eram investigadas, acusadas e condenadas por práticas consideradas comunistas, sendo muitas das vezes sem evidências conclusivas. A liberdade (ou falta) de expressão faz um paralelo competente com a história contada, sempre questionando o poder de nossas escolhas.

Na visão do diretor e dos roteiristas, a propaganda parece ser melhor que a própria vida real, não sendo à toa que a fotografia do polonês Janusz Kaminski empregue tons pálidos e saturados, além do fato de grande parte dos indivíduos trajarem, de maneira frequente, cores escuras para expor essa espécie de infelicidade e/ou pessimismo com tudo que lida. Ainda no que se refere à cor, é também elegante a bola ser da cor vermelha quando os crimes premeditados são puramente passionais, representando, assim, a violência do ato que será (ou seria?) cometido.

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Minority Report – A Nova Lei não exagera em seus conceitos futurísticos. Não existem carros voadores, mas automóveis que se locomovem sem a necessidade de um motorista, quase como se “deslizassem” nas rodovias; nem todas as ruas são limpas e iluminadas; não visualizamos gigantescos outdoors que promovem o consumo excessivo; a tecnologia vista é igualmente crível, concretizando-se, dessa forma, um futuro palpável.

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Spielberg é inteligente ao revelar, por meio da imagem, o tormento que move o protagonista (a morte de seu filho) num flashback coerente, uma vez que é posta na perspectiva de um pesadelo. E, em relação às cenas de ação, continua com sua típica maestria. Difícil esquecer o segmento que possui um plano-sequência através do plongée (quando a câmera filma de cima pra baixo) para revelar todos os apartamentos, culminando num momento de pura tensão (a trilha composta pelo gênio John Williams ajuda muito nesse aspecto) que, no lugar de banalizar todo o campo sonoro, temos o simples estouro de uma bolha como causa para as consequências.

Apesar de algumas conivências que fazem a trama avançar (os olhos do personagem principal foragido ainda darem acesso ao estabelecimento policial e o fato da corrente do ar ser alterada na cena do crime em questões de minutos são alguns exemplos), nada disso compromete o filme porque a obra explora assuntos quase intrínsecos da ficção científica, rendendo boas e frutíferas discussões.

O roteiro equilibra bem os elementos dramáticos (que geram implicações existenciais) com um tímido e pontual, mas não menos eficaz, humor. Como se não bastasse, Minority Report – A Nova Lei utiliza o policial federal (Colin Farrell) com a óbvia função de expor como as coisas funcionam dentro do departamento de polícia e os precogs nos primeiros minutos — contudo, nele reside o flerte com todo o paradoxo e moralidade do que ocorre com o futuro previsto e as bem-intencionadas alterações realizadas pelo Estado. Com isso, o diálogo entre a diegese (a realidade da narrativa) e o nosso mundo é estabelecido com bastante eficiência.

O fato dos olhos serem mostrados, mencionados ou servirem como ferramenta para história também podem serem considerados como uma alegoria sociopolítica. Na metade do século 21, o órgão serve para controlar a sociedade numa espécie de vigilância que muito se assemelha a governos tiranos do passado.

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Além de tudo isso, existe um contraponto no que condiz com a representação da água: se para os precogs simbolizam a pureza (já que eles estão mergulhados nelas com roupas claras), para o crime que atormenta Agatha (interpretada por uma frágil, mas poderosa Samantha Morton), nada mais é que a materialização da imensa capacidade que o ser humano possui de cometer atrocidades — e, mesmo assim, o personagem de Max von Sydow tem motivos para suas ações, visto que pretende alcançar uma sociedade sem assassinatos.

Em determinado momento, escutamos que a morte ocorreu por causa de falha humana, sendo justamente essa questão que o conto e filme procuram debater. Não podemos tolerar proibições absurdas no que se refere à nossa liberdade porque aprendemos com ela, seja no erro ou acerto.

E através de nossas decisões e, consequentemente, do aprendizado, que nos tornamos humanos de verdade.

Nota: ★★★★✰

 

 

 

Ficha técnica

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Nome original: Minority Report

Ano: 2002

Direção: Steven Spielberg

Roteiro: Scott Frank e Jon Cohen (adaptação do livro de Philip K. Dick)

Elenco: Tom Cruise, Colin Farrell, Samantha Norton, Max von Sydow, Neal McDonough, Tim Blake Nelson, Kathryn Morris,

Fotografia: Janusz Kaminski

Design de Produção: Alex McDowell

Montagem: Michael Kahn

 

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Jonatas Rueda

Capixaba, formado em Direito e cinéfilo desde pequeno. Ama literatura e apenas vê séries quando acha que vale muito a pena. Além do cinema, também é movido à música, sendo que em suas playlists nunca podem faltar The Beatles, Bob Dylan, Eric Clapton e Led Zeppelin.

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