Vidro | Análise

 

No ano de 2000, chega aos cinemas Corpo Fechado, e M. Night Shyamalan nos apresentava ao seu universo de super-heróis de forma brilhante, com uma obra de narrativa “quadrinhesca”, mas com uma pegada pouco fantasiosa, mantendo o pé no chão e nos entregando dois estudos de personagens que até hoje são marcantes. Sua continuação só veio em 2016: Fragmentado nos traz uma pegada mais frenética, com uma ótima atuação de James McAvoy. Mas o filme não parecia se ligar de modo algum com o primeiro, apenas em uma cena já no fim, quando aparece em tela David Dunn (Bruce Willis), é que descobrimos a ligação.

Em Vidro, temos o desfecho dessa história. Desde o início, Shyamalan deixou claro que tudo era uma grande homenagem aos quadrinhos. Dentro do que o diretor se propõe, do primeiro filme até este, muitas coisas mudam, principalmente na sutileza: aqui é tudo muito escrachado, não tem espaço para enigmas — mesmo que o diretor tente criar alguns —; é tudo muito aberto.

Não chega a ser isso que torna a obra decepcionante. O problema é o Shyamalan mastigar todos os plots para o público, não nos deixando participar da construção narrativa, criando sequências e mais sequências de explicações exageradas — em um certo ponto uma das personagens chega a explicar o que é um clímax —, tirando a tesão de quem assiste. As tentativas de plot twist são todas frustrantes, é incrível como um dos maiores dons do diretor simplesmente some aqui. Em um certo momento, Joseph Dunn (Spencer Treat Clark) descobre algo que faz toda a história seguir outro caminho, mas os acontecimentos anteriores e a própria reação do personagem ao descobrir tal coisa é tão exagerada, que no momento chave não sentimos o impacto da reviravolta.

Posso estar sendo até um pouco injusto, mas me parece que Shyamalan achou a conclusão dessa história tão maravilhosa, que tinha seu público na mão após o sucesso de Fragmentado, e acabou que seu ego falou mais alto ao não tratar o roteiro com mais cuidado.

O que se destaca positivamente na obra são três coisas: a atuação do James McAvoy é uma bela evolução do filme anterior pra cá, investindo ainda mais na mudança de voz e do seu físico, de acordo com as personalidades; a música do West Dylan Thordson, conduzindo a obra sempre com uma sensação de urgência através do som, rasgando com violinos para causar um certo suspense durante as investigações dos personagens e, durante as cenas mais dramáticas, um piano mais leve. Mesmo parecendo bem clichê, a música funciona exatamente por cumprir a sua proposta.

O terceiro ponto positivo é a câmera do Shyamalan, o seu trabalho com o diretor de fotografia, Mike Gioulakis é bem competente, tanto nos movimentos de câmera, quanto no visual mais “quadrinhesco” da obra. Não chega a ser tão bom quanto o primeiro filme da franquia, mas faz bem o seu papel de separar um visual em particular para cada um dos personagens.

Vidro tem bons personagens, que infelizmente são mal aproveitados, e vários plots que se juntam em um final exageradamente mastigado, ao ponto de quem assiste perder o tesão de acompanhar aquela história — com várias soluções fáceis do roteiro tentando ser maquiadas com diálogos expositivos, atraindo a atenção do púbico para outros pontos. A nova obra de Shyamalan não deixa de ser frustrante.

Nota: ★★✰✰✰

 

 

Ficha Técnica

Direção: M. Night Shyamalan

Roteiro: M. Night Shyamalan

Elenco: James McAvoy, Bruce Willis, Samuel L. Jackson, Anya Taylor-Joy, Sarah Paulson, Spencer Treat Clark, Charlayne Woodard, Luke Kirby, Adam David Thompson, M. Night Shyamalan

Fotografia: Mike Gioulakis

Trilha Sonora: West Dylan Thordson

Montagem: Luke Ciarrocchi, Blu Murray

Design de Produção: Chris Trujillo

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Ítalo Passos

Cearense, estudante de marketing digital e crítico de cinema. Apaixonado por cinema oriental, Tolkien e ficção científica. Um samurai de Akira Kurosawa que venera o Kubrick. E eu não estou aqui pra contrariar o The Rock.

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One thought on “Vidro | Análise

  • 2 de fevereiro de 2019 at 05:33
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    Parabéns pela crítica!!

    Concordo e, sinceramente, acho que você “pegou leve”. Puxa…que decepção foi esse terceiro filme! Eu adorei Corpo Fechado e Fragmentado, fiz campanha para as pessoas assistirem e, como Mr. Night pode estragar tudo com seu ego neste último!

    Enredo péssimo! Introdução de personagens que não se conectam ao tom “realista” dos filmes anteriores…e, QUANTA EXPLICAÇÃO exagerada!
    Plot twists fracos e sem contexto…afff

    Temos que falar da trilha sonora e fotografia para salvarmos algo desta decepcionante obra.

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