Clube Cartoon | Dumbo

 

Após o fracasso nas bilheterias de Fantasia e Pinóquio (ambos de 1940) devido aos temas obscuros abordados e também pela longa duração para o formato, o estúdio Disney, um ano depois, volta a ter um grande êxito financeiro com Dumbo. Com uma duração curtíssima (um pouco mais de 1 hora) e com desenhos menos sofisticados que outros do mesmo período, a obra tem valor e charme justamente pela simplicidade, seja no aspecto visual quanto temático.

Enquanto os principais artistas estavam trabalhando arduamente no projeto que seria denominado Bambi (a análise desse clássico pode ser conferida aqui) para extrair um realismo dos movimentos dos animais da floresta e estilização dos ambientes, aqui não existe essa intenção; pelo contrário: a animação contou com uma produção bem barata, tornando-se bem semelhante a vários curtas que o estúdio sempre fazia todos os anos.

É verdade que existem sequências deslumbrantes que conseguem explorar toda a criatividade dos responsáveis por aqueles desenhos (sendo o melhor exemplo toda a psicodélica e alucinante cena que envolve elefantes coloridos e dançantes), porém, o que faz o filme sincero e atemporal é a essência do roteiro adaptado do livro de Helen Aberson e Harold Pearl.

A mãe do protagonista tenta proteger seu pequeno filho por ser ridicularizado não apenas pelos humanos, mas também pela sua própria espécie devido às suas grandes orelhas e, como consequência, é enjaulada. Com isso, a jornada do protagonista é saber lidar com todas essas adversidades de um mundo cruel — algo que fica mais irônico, uma vez que toda a diegese é estabelecida dentro de um circo ambulante.

O pequeno elefante não fala uma palavra sequer durante toda a duração e muitos dos personagens possuem poucos diálogos. Por isso, a obra constrói alguns simbolismos e metáforas elegantes para avançar a narrativa puramente através das imagens desde os créditos iniciais, que emulam pôsteres circenses da época.

Se os olhos azuis da mãe se transformam em vermelhos num momento de pura ira, é sutil a dualidade imposta entre as listras do imenso circo com a silhueta das grades da prisão fixadas no corpo da Sra. Jumbo para revelar o paralelo entre os dois que, apesar de não estarem no mesmo local, compartilham a idêntica tristeza provocada pela ausência.

dumbo

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O auge dessa lógica é exposta na belíssima cena (de arrancar lágrimas) no qual os dois se encontram, mas não podem concretizar esse amor de maneira apropriada, fazendo com que a tromba praticamente abrace o personagem principal ao som da canção (indicada ao Oscar) “Baby Mine” — e, mesmo que não exiba quem está cantando em momento algum, presume-se que tal função é designada à própria figura materna aprisionada em virtude da doce e melancólica letra.

Como se não bastasse, ainda nesse segmento, os diretores são inteligentes ao realizarem um emocionante contraponto ao evidenciar os outros animais, juntos de suas famílias, para consolidar que não existe castigo maior que ficar longe de seu próprio filho.

Diferente do live-action de Tim Burton, o filme de 1941 não dá muito espaço para os humanos e foca na trajetória de Dumbo com o ratinho Timothy; o que além de dar uma leveza por causa da comédia das ações e situações, intensifica ainda mais o viés de fábula almejado, principalmente ao já se iniciar com cegonhas entregando filhotes a diferentes espécies de animais durante uma noite estrelada.

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Contudo, o principal objetivo é explorar os desdobramentos de família e maternidade, enriquecendo, assim, a estrutura sentimental da película. Enquanto o público mais jovem, provavelmente, manterá uma relação mais próxima com o simpático elefante orelhudo e sua angústia por não ser aceito dentro do meio em que vive em razão de suas peculiaridades, os espectadores mais velhos poderão também experienciar uma sensação mais paterna/materna com o “outro lado da moeda” ao constatarem que fariam de tudo para defender seu próprio sangue.

Embora seja bem apressado nos minutos finais e possuir alguns diálogos expositivos, até o elemento que tornou Dumbo bastante relevante na cultura popular (o fato de poder voar) só é descoberto nos últimos momentos, firmando a linda mensagem sobre aceitação e de que é possível superar os obstáculos que são colocados em nossas vidas.

Por isso tudo (e mais um pouco) foi o filme favorito de Walt Disney.

Nota: ★★★★✰

 

 

 

Ficha técnica

Ano: 1941

Direção: Sam Armstrong, Norman Ferguson, Jack Kinney, Bill Roberts, Ben Sharpsteen e Wilfred Jackson

Roteiro: Joe Wright, Dick Huemer, Otto Englander, Bill Peet, Aurie Battaglia, Joe Rinaldi, George Stallings e Webb Smith (adaptação do livro de Helen Aberson e Harold Pearl)

Elenco: Edward Brophy, Cliff Edwards, James Baskett, Herman Bing, Verna Felton, Sterling Holloway, Mel Blanc, Sarah Selby

Trilha Sonora: Frank Churchill e Oliver Wallace

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Jonatas Rueda

Capixaba, formado em Direito e cinéfilo desde pequeno. Ama literatura e apenas vê séries quando acha que vale muito a pena. Além do cinema, também é movido à música, sendo que em suas playlists nunca podem faltar The Beatles, Bob Dylan, Eric Clapton e Led Zeppelin.

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