Nos Cinemas | Parasita

 

O filme acompanha uma família de classe baixa na Coreia, onde esta mesma faz bicos para uma pizzaria de bairro e vive praticamente abaixo da terra, com a janela colada no chão da vila, criando uma vista icônica e bem significativa. Logo na primeira cena entendemos o quanto aquela família é necessitada quando um homem passa com um equipamento de dedetização na rua, borrifando o produto nos canteiros da vila, e o Sr. Kim (Kang-ho Song) pede para deixar a janela aberta para ganharem uma dedetização sem custos.

Tudo começa a mudar quando Ki-woo (Woo-sik Choi) é convidado por seu melhor amigo a ficar no seu lugar dando aulas particulares a uma garota rica. Aceitando o cargo, ele passa a ganhar uma quantia considerável e ajudar seus familiares. É interessante notar que o quão bem Bong Joon-ho trabalha sua mise en scène, mostrando o lar do protagonista quase como uma toca, com espaço limitado, totalmente claustrofóbico, usando closes para aumentar a sensação de aperto, nos fazendo ficar de certa forma angustiados.

Já na mansão em que Ki-woo dá aulas, é o contraste disso: a câmera bem aberta, com móveis impecáveis, com cores limpas e sóbrias, dando um clima de organização e que tudo ali está no controle de seus donos; notamos que quando Park Dong-ik (Sun-kyun Lee) está subindo as escadas, as luzes vão o acompanhando, acendendo uma de cada vez, quase como um louvor à pessoa dele. Bong Joon-ho investe nos detalhes para nos fazer imergir na enorme diferença social que existe entre as duas famílias, fazendo de tudo para que entendamos o que cada um passa, sejam situações boas ou ruins, se os divertem ou não. O diretor está focado em criar uma narrativa que faça o público estar junto aos personagens.

A música ajuda a atmosfera do filme, deixando os conflitos mais densos, acentuando o drama quando necessário e criando uma tensão, e ela ajuda nos momentos mais descontraídos, principalmente nos momentos em que o filme transita do drama para quase um filme de comédia. Esse é um dos principais pontos sobre o qual podemos dizer que o brilhantismo do diretor mais se destaca. A transição entre gêneros, o quanto o filme brinca com o público sobre onde quer chegar, manipulando até nossas teorias criadas durante a narrativa.

Isso tudo é a cobertura do bolo, que molda todas as camadas mais profundas em que o filme trabalha. Como falei antes, a luta de classes é algo extremamente presente no filme, e um dos momentos que mais se destacam é a transformação do Sr. Kim, quando ouve seus patrões falando que pessoas que andam de metrô tem um forte cheiro diferente, rebaixando as pessoas que necessitam do transporte público para chegar ao trabalho ou em suas casas.

Nesse ponto, a atuação de Kang-ho Song muda completamente: a simpatia e, em certos momentos, o personagem meio bobo dá lugar a um olhar frio e cheio de amargura, a expressão de sofrimento, a humilhação vem à tona. E de forma extremamente metafórica, o orgulho do personagem vai por água abaixo junto com a chuva que, na sequência seguinte, inunda a casa de sua família; a toca onde eles sobreviviam, mesmo sem luxo, mas felizes, se torna completamente inabitável. É um dos pontos chave que faz com que o Sr. Kim tome as atitudes do sensacional clímax de Parasita.

Clímax esse que faz tudo o que um filme precisa, pega todos os elementos entregues, e os transforma em conclusões, desde suas metáforas sobre o mito da caverna de Platão — mesmo sendo bem batido, Bong Joon-ho o utiliza a ideia de modo que se encaixa perfeitamente na nossa atualidade social. infelizmente não posso dar detalhes sobre a sequência, pois estragaria sua experiencia, mas quando assistir ao filme, você irá saber do que estou falando.

É admirável ver o cinema coreano, que mesmo sendo de um país bastante tradicionalista e em certos pontos retrógrado (principalmente quando se trata do machismo), elaborando obras que trazem uma mensagem extremamente importante socialmente falando, assim como nos entrega personagens tão reais e cativantes, que nos fazem refletir sobre nosso comportamento, em como as pequenas atitudes podem mudar completamente uma pessoa. Parasita é brilhante.

Nota: ★★★★★

Ficha Técnica

Título Original: Gisaengchung

Direção: Bong Joon-ho

Roteiro: Bong Joon-ho, Han Jin-won

Elenco: Song Kang-ho, Lee Sun-kyun, Cho Yeo-jeong, Choi Woo-shik, Park So-dam, Lee Jung-eun, Chang Hyae-jin, Park Myung-hoon, Jung Ji-so, Jung Hyeon-jun

Fotografia: Hong Kyung-pyo

Música: Jung Jae-il

Montagem: Yang Jin-mo

Figurino: Choi Se-yeon

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Ítalo Passos

Cearense, estudante de marketing digital e crítico de cinema. Apaixonado por cinema oriental, Tolkien e ficção científica. Um samurai de Akira Kurosawa que venera o Kubrick. E eu não estou aqui pra contrariar o The Rock.

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