Nos Cinemas | As Golpistas

No dia 15 de setembro de 2008, os Estados Unidos amanheceram mergulhados em uma crise financeira de proporções devastadoras há muitas décadas não vista. Essa data, conhecida como “segunda-feira negra”, ficou marcada pela falência de um dos bancos mais tradicionais do país, o Lehman Brothers, o que gerou efeitos catastróficos nas Bolsas ao redor do mundo.

Esse tema, presente em filmes como Margin Call – O Dia Antes do Fim e A Grande Aposta, que são obras mais focadas naqueles diretamente envolvidos no submundo de Wall Street, é abordado no novo filme de Lorene Scafaria (de Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo) a partir de um ponto de vista diferente: de um grupo de strippers que possui como clientes acionistas, investidores e executivos, de bancos e da bolsa de valores de Nova York.

Golpistas

Baseado no artigo escrito pela jornalista Jessica Pressler para a New York Magazine, intitulado “The Hustlers at Scores: The Ex-Strippers Who Stole From (Mostly) Rich Men and Gave to, Well, Themselves, As Golpistas conta a história de Destiny (interpretada por Constance Wu) que trabalha como stripper para conseguir cuidar da avó debilitada (e quase falhando na tarefa) para, logo em seguida, conhecer Ramona (Jennifer Lopez), a estrela do strip club, capaz de hipnotizar e arrancar dos homens uma enorme quantidade de gorjeta.

Ela a acolhe e a orienta a ser bem-sucedida no local, ensinando desde passos de pole dance, seguindo pelo estudo dos perfis dos frequentadores do clube e chegando até a lecionar como seduzir os homens para conseguir mais dinheiro. As duas se tornam inseparáveis e, ao mesmo tempo, passam a ganhar cada vez mais dinheiro até que a crise de 2008 estoura e elas veem seus clientes desaparecerem, afetando diretamente seus rendimentos. Para contornar essa situação, se unem à Mercedes (Keke Palmer) e Annabelle (Lili Reinhart), duas outras strippers do espaço e arquitetam um plano que consiste em seduzir e drogar homens ricos em um restaurante, levá-los ao strip club e lucrar a partir do uso de seus cartões de crédito no local.

O ponto mais interessante de As Golpistas é a análise da crise de 2008 a partir do ponto de vista dessas strippers que possuíam como clientes justamente os responsáveis pelo colapso econômico de Wall Street e, consequentemente, do país. É um olhar de quem convivia diretamente com aqueles que (até 2007) se consideravam deuses; seres superiores no direito de fazer o que quisessem, enriquecendo com o dinheiro dos mais vulneráveis.

Apesar de Constance Wu e sua Destiny terem camadas e a atriz interpretá-la de forma satisfatória, é Jennifer Lopez e sua Ramona que roubam a cena. Desde a sua primeira aparição durante um impressionante número de pole dance, a atriz e cantora ao mesmo tempo em que ganha o público ao trazer carisma e simpatia à sua personagem, fazendo dela uma líder/mentora inteligente e carinhosa que também desempenha um papel materno para as outras meninas, a transforma numa figura calculista e impiedosa quando seus interesses estão sob risco. Pela sua atuação, Lopez tem boas chances de beliscar uma indicação à atriz coadjuvante no Oscar 2020.

Cabe ressaltar a utilização de canções pop que estavam em alta no período para pontuar os anos em que a história está. Músicas como Gimme More, Beautiful Girls, Love In This Club, Birthday Cake, e Royals geram uma nostalgia, assim como tiram um sorriso de qualquer fã do gênero.

No entanto, nem tudo é positivo em As Golpistas. A estrutura de seu roteiro é um pouco bagunçada, onde a utilização do recurso clichê de um/uma jornalista entrevistando alguém é feito de maneira abrupta. Os conflitos presentes na entrevista são jogados e resolvidos de forma rápida e previsível, anulando qualquer tipo de tensão.

Outro ponto negativo é o início da amizade entre Destiny e Ramona, que acontece de modo inverossímil a partir do momento em que o acolhimento da personagem de Lopez à de Wu ocorre de forma fácil demais. Por um lado, é positivo ver duas personagens que dividem o mesmo espaço de trabalho serem tão receptivas uma com a outra, mas supõe-se que a realidade não seja bem assim, já que o mundo do striptease é marcado pela competição e desconfiança.

Por último, a comédia do filme tem altos e baixos, inclusive a insistência na mesma gag sendo repetida em diversos momentos por uma das personagens quando ela enfrenta situações de perigo ou que a deixam nervosa, perdendo a graça quando já é mencionada na segunda vez.

Golpistas

As Golpistas, além de contar com uma excepcional Jennifer Lopez em cena, é um retrato muito bem realizado, através de uma nova perspectiva, sobre a crise de 2008 e seus desdobramentos dos Estados Unidos e do seu sistema financeiro predatório, misógino e machista composto por homens ricos que se consideram acima de tudo e livres para fazer o que bem entenderem.

Chegou o momento das mulheres mudarem isso.

Nota: ★★★★✰

 

Ficha técnica

Título Original: Hustlers

Direção: Lorene Scafaria

Roteiro: Lorene Scafaria

Elenco: Constance Wu, Jennifer Lopez, Julia Stiles, Keke Palmer, Lili Reinhart, Lizzo, Cardi B, Mette Towley, Wai Ching Ho, Emma Batiz, Vanessa Aspillaga

Fotografia: Todd Banhazl

Montagem: Kayla Emter

Figurino: Mitchell Travers

 

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Vinicius Dias

Carioca graduado em Relações Internacionais, não sabe muito bem quando começou a sua paixão pela Sétima Arte, mas lembra de ter visto Tarzan (1999) no cinema três vezes e de ter sua fita dupla de Titanic (1997) confiscada pela sua mãe por assistir ao filme mais vezes do que deveria. Não gosta de chocolate, café e Coca-Cola, mas é apaixonado por Madonna, Kylie Minogue e Stanley Kubrick.

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