Nos Cinemas | Star Wars: A Ascensão Skywalker

 

Esse texto contém spoilers

 

A importância dessa saga é inegável e difícil de mensurar porque não é apenas relevante dentro da indústria cinematográfica com suas inovações tecnológicas, como também no âmbito social por fomentar a imaginação de toda uma geração numa mistura perfeita de entretenimento com assuntos sérios de plano de fundo.

Star Wars: Os Últimos Jedi concretizou (de uma vez por todas) que a franquia era muito mais que determinados personagens. Era um universo rico e repleto de oportunidades para estabelecer a troca de gerações, usando o saudosismo de forma inteligente e brilhantemente desconstruindo a imagem do herói — este que foi um dos alicerces para a longevidade de Star Wars.

Se em Star Wars: O Despertar da Força utiliza-se muito dos elementos que são praticamente marcas registradas dos filmes anteriores, na obra de 2017 o diretor Rian Johnson possui uma espécie de “licença” para, de maneira pontual, explorar a narrativa de modo diferente, conectando esse fato com a própria determinação dos realizadores de não se restringirem tanto assim ao passado.

O criador George Lucas, por mais criticado que foi com os prequels, ainda tinha uma paixão pelo material que fez; uma vontade de se arriscar e realizar algo novo, mesmo que tenha falhado em diversos aspectos. E o último capítulo da história da família Skywalker erra ao não compreender a fronteira entre homenagem e um trabalho com algum vestígio de originalidade.

Um filme calculado e norteado pelo sucesso financeiro e não artístico apenas para agradar os fãs mais extremistas que tanto criticaram o episódio anterior, ficando mais que óbvio o anseio de responder as perguntas e deixar de lado a expansão do arco como um todo através de escolhas e dilemas que provoquem o embate. Em outras palavras: uma carta de desculpas que renega tudo que foi construído para se apoiar no fan service inorgânico e barato, para arrancar gritos da plateia em detrimento do desenvolvimento e motivação que movem os personagens.

Fica clara essa vontade de consertar as escolhas tomadas já no primeiro ato de Star Wars: A Ascensão Skywalker. São tantos jump cuts e tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que o espectador fica até atordoado com a pressa de avançar a aventura através da ferramenta narrativa que é o MacGuffin — que, nesse caso específico, é o objeto que levará os protagonistas ao local onde está o Imperador Palpatine e que já foi melhor usado no filme original com R2-D2, já que esse mesmo objeto era um robô com carisma e utilidade para outras situações de perigo.

O roteiro escrito por J.J. Abrams e Chris Terrio, além de ter novos personagens subtilizados que só servem para um propósito exclusivo designado para que o enredo avance, situações coniventes e o retorno desnecessário de alguns indivíduos que somente comprovam a falta de inspiração, detém diálogos tão expositivos que o gosto amargo deixado pelos prequels é, mais uma vez, experimentado.

A cena em que C-3PO demonstra afeto pelos companheiros seguida pela palavra “triste” do mais novo droide denominado D-O e o segmento que Palpatine exterioriza repetidamente que o ataque de Rey (Daisy Ridley) fará com que ela seja dominada pelo lado negro da Força e, como consequência, a vingança dos Sith estará completa são os melhores exemplos dessa falha pedestre.

Como se não bastasse, não existe qualquer profundidade dramática e peso da consequência. Chewbacca é tido como morto, porém, na cena seguinte, já sabemos que o mesmo sobreviveu; a memória de C-3PO que deve ser apagada para que o código seja revelado é, minutos depois, restaurada com o backup contido em R2-D2. O único engajamento emocional poderia vir da morte da General Organa (e eternamente Princesa Leia), mas até isso é tratado de maneira que não traz cicatrizes e evolução interna. A falta de coragem dos criadores é tanta que a morte dessa querida personagem só é feita por conta do falecimento de Carrie Fisher em dezembro de 2016, tornando-se inviável uma participação maior e mais efetiva.

A complexidade moral de Kylo Ren (interpretado pelo ótimo Adam Driver) é outro ponto fraco do roteiro. O conflito sempre foi um elemento promissor em toda a saga, seja em Anakin ou em Luke (e ambos trajam vestimentas negras no capítulo final de suas respectivas trilogias), porém, aqui é resolvido de forma preguiçosa com uma simples conversa com seu falecido pai por meio da sua própria memória.

Colocando de lado a possibilidade disso ocorrer na realidade daquele universo, nota-se a vontade de inserir uma participação deslocada de Han Solo (vivido por Harrison Ford) para deixar os fãs no mais puro êxtase, do mesmo modo que Palpatine ser avô de Rey demonstra essa necessidade injustificável de se agarrar ao passado para conectar as coisas do jeito mais pobre possível.

A ausência de sutilidade imagética é bem decepcionante. Em Star Wars: O Império Contra-Ataca, o protagonista adentra a floresta e visualiza seu rosto dentro do capacete icônico de Darth Vader para simbolizar a sina da família (onde essa relação de pai e filho é descoberta somente no ato final), como também o poder sedutor do lado negro da Força.

Já nessa nova empreitada nada disso acontece porque, apesar de ser uma imagem que causou impacto no trailer, não há preparação emocional (a revelação ocorre para depois a protagonista se ver segurando o sabre de luz vermelho numa capa negra) e muito menos recompensa no terceiro ato para o que foi arquitetado, uma vez que tudo é muito abrupto e não existirá mais um longa para abordar essa perspectiva dramática.

Não é um completo desastre pois o trabalho sonoro e visual prioriza o completo espetáculo, desde o eficaz design de produção que dá personalidade para cada planeta até a sempre competente trilha sonora composta pelo mestre John Williams que ainda consegue trazer frescor com os temas conhecidos, além das boas e/ou corretas atuações de todo elenco.

Contudo, nada disso serve quando algo é genérico, vazio e sem vida — coisa que Star Wars nunca foi, por mais que tivesse sua veia estruturada no entretenimento, possuía personagens fascinantes, temas importantes e um humor sagaz.

O diretor nova iorquino Martin Scorsese foi contestado por certas afirmações sobre se os filmes da Marvel eram cinema ou não. Depois de algumas semanas aprofundou ainda mais essa questão num artigo e ficou claro que não se direcionava apenas à Marvel, mas para todas aquelas obras sem qualquer resquício criativo que eram feitas por executivos de grandes estúdios, em que a legítima experiência de ir no cinema para sentir emoções que apenas a Arte pode proporcionar é substituída e comparada a um parque de diversões.

A ironia reside no fato de que a ideia de Lucas (iniciada no final da década de 1970 e finalizada na década de 1980) é um dos grandes símbolos da infindável imaginação de múltiplos artistas, mas que, gradativamente, foi se tornando somente mais um mero produto dentro do sistema capitalista.

Um gigantesco parque temático que se tornou literal e que pode ser encontrado em vários lugares dos Estados Unidos.

Nota: ★★✰✰

 

 

Ficha técnica

Nome Original: Star Wars: Episode IX – The Rise of Skywalker

Direção: J.J. Abrams

Roteiro: J.J. Abrams e Chris Terrio (baseado nos personagens criados por George Lucas)

Elenco: Daisy Ridley, Adam Driver, Oscar Isaac, John Boyega, Carrie Fisher, Mark Hamill, Ian McDiarmid, Billy Dee Williams, Anthony Daniels, Domhnall Gleeson, Richard E. Grant, Lupita Nyong’o

Montagem: Maryann Brandon e Stefan Grube

Fotografia: Dan Mindel

 

 

 

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Jonatas Rueda

Capixaba, formado em Direito e cinéfilo desde pequeno. Ama literatura e apenas vê séries quando acha que vale muito a pena. Além do cinema, também é movido à música, sendo que em suas playlists nunca podem faltar The Beatles, Bob Dylan, Eric Clapton e Led Zeppelin.

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