Bang Bang | Onde Começa o Inferno

 

Em 1952, no auge da caça aos “comunistas” em Hollywood, estreava Matar ou Morrer (de Fred Zinnemann) com o roteiro de Carl Foreman, que trazia toda uma simbologia de como o roteirista ficou isolado e que foi perseguido pelo governo americano e impedido de participar das gravações do filme do qual tinha um roteiro com sua assinatura.

Matar ou Morrer é um filme bem pessimista, mostra um Velho Oeste no qual as pessoas só ligam para o seu próprio umbigo, fazendo com que o protagonista fique isolado e, de certa forma, impedido de seguir sua profissão livremente.

E é por conta deste filme que Onde Começa o Inferno existe; é uma resposta direta de Howard Hawks e John Wayne ao filme de Zinnemann e Foreman, já que ambos o achavam um longa antipatriota e que ia totalmente contra ao que é ser americano de verdade.

No filme de Hawks temos uma vibe completamente diferente. Pessoas de várias etnias convivendo em paz, um querendo ajudar o outro com vários momentos mais descontraídos, até mesmo os vilões são mais tranquilos, onde a ação vista é só um plano de fundo para o que realmente importa: os personagens.

Mesmo sendo um “filme-resposta” para o filme de 1952, a obra acaba ainda tratando de assuntos mais delicados, como o fato dos homens daquela época tinham que lidar com seus vícios, nisso o alcoolismo de “Borrachón” (Dean Martin) fica em destaque — inclusive sua atuação acaba roubando a cena, já que ele é o mais quebrado e cheio de traumas. Contudo, mesmo assim, toda projeção não se torna algo depressivo, como disse, por haver momentos de descontração e humor.

A história basicamente gira na figura de Chance (John Wayne), que prende um assassino, com a ajuda de Borrachón, do qual seu irmão tem muita influencia na região, e ambos, juntos com Colorado Ryan (Ricky Nelson) e Stumpy (Walter Brennan), acabam tendo que segurar os capangas de Nathan Burdette (John Russell) que irão agir a todo custo para libertar o prisioneiro, enquanto os delegados aguardam um oficial federal chegar a cidade para dar a sentença ao prisioneiro.

Nesse ponto, Onde Começa o Inferno lembra um pouco um jogo de xadrez, uma vez que os capangas não atacam a delegacia de frente, mas tramam muitas emboscadas pela cidade.

Ainda com tudo isso, há um momento do qual me emocionou bastante, onde os quatro estão trancados na delegacia, aguardando o tempo passar e cantando algumas canções. Isso pode parecer bobo (ou até mesmo anticlimático num primeiro momento), mas é exatamente onde o diretor encontra espaço para humanizar aqueles indivíduos, trazendo-os para junto de nós. Mesmo com seus problemas e traumas, naquele momento quase único, não existem vícios ou bandidos para serem combatidos, apenas a camaradagem e o respiro.

Como eu falei, não é um filme tenso ou cheio de melancolia em cima dos personagens, mas existem seus momentos, onde “compramos de vez” a briga daquelas pessoas não pela cidade em si, mas por cada um que está ali envolvido, ainda que existam todos os problemas psicológicos do mundo os quebrando por dentro.

O filme não chega a ser perfeito porque existem alguns pontos dos quais me tiraram um pouco daquele universo, contudo, não chegam a afetar diretamente a narrativa. O romance forçado entre Chance e Feathers (Angie Dickinson) é bastante deslocado. Claro que para a ideia do diretor, o grande herói americano tinha que ter sua donzela ao lado, porém, acaba quebrando bastante o ritmo — inclusive o filme deixa de ter um corte final perfeito pra contar a conclusão deste casal.

Tirando isso, Onde Começa o Inferno é mais um grande clássico do cinema western e uma grande resposta a Matar ou Morrer. São filmes com visões bem diferentes de como a América funcionava e os reflexos e consequências disso nos tempos atuais, mas cada um tem suas sutilezas que elevam o nível da sétima arte.

Nota: ★★★★✰

 

Título Original: Rio Bravo

Ano: 1959

Direção: Howard Hawks

Roteiro: Jules Furthman, Leigh Brackett

Elenco: John Wayne, Dean Martin, Ricky Nelson, Angie Dickinson, Walter Brennan, Ward Bond, John Russell, Pedro Gonzalez Gonzalez, Claude Akins

Fotografia: Russell Harlan

Trilha Sonora: Dimitri Tiomkin

Montagem: Folmar Blangsted

Figurino: Marjorie Best

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Ítalo Passos

Cearense, estudante de marketing digital e crítico de cinema. Apaixonado por cinema oriental, Tolkien e ficção científica. Um samurai de Akira Kurosawa que venera o Kubrick. E eu não estou aqui pra contrariar o The Rock.

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