Clube Cartoon | Ratatouille

 

Conhecer Paris é o sonho de muita gente. E quando se imagina passear pela Cidade Luz, certamente o passeio inclui se esbaldar na culinária local. Afinal, além da Torre Eiffel, do Arco do Triunfo, da Champs-Elysée, do Louvre… não é pela gastronomia e por ser berço de grandes chefs que Paris é o destino dos sonhos?

A Disney/Pixar aproveita o deslumbramento pela culinária francesa em uma narrativa bem recheada pela especialidade dos estúdios: os sonhos e a determinação para realizá-los. Porém, mais que isso, constrói uma história cheia de significados sobre autoestima, respeito e tolerância.

Em Ratatouille, Remy é um ratinho cheio de talento com os alimentos. Sua paixão pela boa comida e seus sentidos apurados o tornam diferente do restante dos ratos, algo que não é muito bem aceito ou compreendido por seu pai, para quem comida é apenas um combustível. Remy não se sente confortável com sua condição de “ladrão de comida”, mas gostaria de, ao menos, roubar alimentos decentes ao invés de remexer o lixo alheio: “se você é o que come, então só quero comer coisas boas”, diz ele.

O fascínio de Remy com os humanos começa com o que podemos fazer com ingredientes, as receitas e no que elas se transformam. Mas vai além. O ratinho é tão humanizado que anda sobre as patas traseiras, assiste TV e sabe ler. E é através da TV e da leitura que ele se torna fã de Auguste Gusteau, o famoso chef de um dos restaurantes mais badalados da capital francesa. Segundo o chef, “A arte de cozinhar não é para aqueles que não arriscam” e “Qualquer um pode cozinhar. Mas só os destemidos serão notáveis”. Gusteau e sua defesa de poder ser e fazer o que quiser são combustíveis dos sonhos de Remy.

Do lado humano da história está Linguini. Um jovem desajeitado, inseguro, tímido, que vai pedir emprego no restaurante onde sua falecida mãe trabalhava: o Gusteau’s. O destino faz com que os caminhos de Linguini e Remy se cruzem e os levem diretamente para a cozinha do restaurante. É interessante perceber que os dois são iguais no quesito de se sentirem deslocados. Quando o rapaz se dá conta de que o ratinho está respondendo suas perguntas com gestos de cabeça e pergunta se ele está mesmo entendendo, nasce, ali, uma conexão mais profunda — Remy não entende apenas o que ele está dizendo; o rato entende quem ele é e o que sente.

Com um estilo gráfico maravilhoso dos alimentos, Ratatouille deixa o espectador com água na boca, ao mesmo tempo em que se aprofunda em outras questões do mundo da gastronomia. Temos, por exemplo, Colette, a única mulher na cozinha do Gusteau’s. Ela explica isso e o fato de precisar se impor mais para conquistar seu espaço: “a gastronomia é uma hierarquia antiquada apoiada em regras feitas por homens velhos e estúpidos. Regras elaboradas para impossibilitar que as mulheres entrem nesse mundo”.

Já Skinner, o atual chef do Gusteau’s, só pensa em lucro, o que vai contra os princípios do criador do restaurante e de qualquer chef de verdade. Se cozinhar é uma arte, o ponto principal deve ser a obra, que deve ter alma e exige dedicação – não o ganho puro e simples. Como em qualquer arte, o retorno financeiro é uma consequência, o reconhecimento do trabalho. A visão de lucro a qualquer custo de Skinner vai de encontro às expectativas de sua própria equipe.

Voltando ao ponto de vista social, Rataouille é uma fábula que, por vezes, parece uma metáfora do mundo moderno, com um forte discurso nas entrelinhas contra o preconceito e a intolerância. Além da lição de aceitar o diferente, o filme mostra que o mundo está constantemente tentando nos encaixar em padrões, não nos permitindo crescer para sermos mais do que aparentamos; mas também deixa claro que é possível lutar contra essa imposição.

Comida não e só combustível: também é conforto, familiaridade e memória afetiva. É disso, também, que Ratatouille vem nos lembrar. E, no processo, nos envolve em uma sensação que é um misto de aconchego, esperança e energia para fazer as coisas aconteçam. Tudo através da história de um ratinho esperto e sonhador que só queria o seu lugar no mundo.

Nota: ★★★★★

Ficha Técnica:

Ratatouille

Ano: 2007

Diretor: Brad Bird e John Pinkava

Roteiro: Brad Bird

Fotografia: Robert Anderson

Trilha sonora: Michael Giacchino

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Roseana Marinho

Roseana é publicitária e acha que os dias deveriam ter pelo menos 30h para trabalhar e ainda poder ver todos os filmes e séries que deseja. Não consegue parar de comprar livros ou largar o chocolate. Tem um lado meio nerd e outro meio bailarina.

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