Clube Cartoon | Bambi

 

Quase todo mundo sabe da magnitude de Walt Disney, não somente para as animações, mas para a indústria cinematográfica como um todo. Responsável por produzir a primeira animação na forma de longa-metragem no final da década de 1930, também iria ultrapassar barreiras com Pinóquio, Fantasia (ambos do mesmo ano) e inovar o campo estético de suas obras com Bambi, em 1942.

A simples trama não procura grandes eventos para atrair o espectador. No lugar, permeia sua narrativa com o tema mais enigmático e desafiador que há: a vida. E o tema dessa espécie de ciclo da vida é pontuado com a linda canção (indicada ao Oscar) “Love Is a Song“, tanto no começo quanto no final da obra, onde o protagonista ocupa diferentes posições para ressaltar a transição e, logicamente, sua evolução dentro daquele ambiente.

Além do príncipe da floresta, temos personagens secundários importantes (destaque para o coelho Tambor) que exteriorizam um humor pontual, inocente e necessário para uma obra mais preocupada em explorar assuntos relevantes do que ser apenas um mero entretenimento escapista.

O âmbito visual, do começo ao fim, é irretocável. O método usado gera à natureza (que é praticamente um personagem) textura e extrema profundidade — adquirindo essa excelência por causa da câmera multiplano que registrava os desenhos em até 7 camadas e podendo também se locomover de maneira vertical.

É tão lindo cada um dos frames que, muitas das vezes, parece estarmos visualizando pinturas do movimento impressionista. O objetivo não era explorar o realismo dos ambientes, mas sim uma estilização de tudo aquilo. Desde as estações retratadas até a poça d’água que reflete o céu laranja após a forte tempestade, nota-se o imenso trabalho e cuidado daqueles artistas em criar algo verdadeiramente extraordinário.

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Comparado a maioria dos filmes de animação, Bambi possui pouquíssimos diálogos, além de ser a primeira película do estúdio a pôr músicas fora da diegese, ou seja, seres que cantam fora daquela realidade manifestada. Exatamente por isso, a trilha sonora (também indicada ao Oscar) de Frank Churchill e Edward H. Plumb é crucial para o êxito artístico e influência que possui dentro do gênero porque entra em completa harmonia com as ações dos personagens, onde a cena do protagonista aprendendo a andar e também conhecendo o gelo e a neve são alguns dos melhores exemplos.

Por outro lado, se a música representa vida, é sintomático que os poucos segmentos de puro silêncio envolvam a espécie humana. A mãe de Bambi, em certo momento, fala com pavor que o homem estava na floresta, portanto, a ausência de qualquer sonoridade em seguida faz como se a natureza morresse por alguns segundos.

Apesar do encerramento esperançoso, esse pessimismo em relação ao homem e nossas ações que prejudicam o ecossistema é justificável, já que foi lançado em plena segunda guerra mundial. Os humanos sofrem ligeiramente com o estereótipo da materialização da maldade, porém, o fato de estarmos sempre presenciando a perspectiva daqueles animais faz total sentido para a narrativa.

Não revelar os indivíduos que cometem barbaridades (e só saber quando estão à espreita por meio da inspirada trilha sonora) torna tudo mais tenso e urgente, quase sendo um elemento indestrutível que pode aparecer a qualquer momento. E não é por acaso que a cor vermelha só apareça nos últimos minutos com a intenção de representar a violência que nossa espécie traz ao causar uma destruição gigantesca naquela floresta — algo que muito se assemelha ao próprio conceito de inferno, como também reforça, de uma vez por todas, o seu viés ecológico.

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O ápice dessa lógica ocorre numa das cenas mais memoráveis da filmografia do estúdio: a morte da mãe como símbolo máximo do fim abrupto da infância. Acontecendo no extracampo da tela (talvez para atingir todas as faixas etárias no cinema), o poder daquelas imagens ecoa uma tristeza poucas vezes vistas em qualquer filme criado pela Disney, tornando-se mais impressionante se pensar que ainda era o começo daquela nova plataforma.

Diferente da abordagem do clássico O Rei Leão (a análise você pode ler aqui) que usa o falecimento como catalisador para os futuros eventos, aqui não há muito tempo para chorar, lamentar ou se culpar. A existência é uma estrada imprevisível em que temos que saber lidar com as desgraças e erros que nos atingem, mas também, ao mesmo tempo, praticar o amor e empatia ao próximo.

Nota: ★★★★★

 

 

 

Ficha técnica

bambiNome Original: Bambi

Ano: 1942

Direção: James Algar, Samuel Armstrong, David Hand, Bill Roberts, Paul Satterfield, Graham Heid e Norman Wright

Roteiro: Perce Pearce, Larry Morey, Vernon Stallings, Mel Shaw, Ralph Wright, Chuck Couch e Carl Fallberg (adaptação do livro de Felix Salten)

Elenco: Hardie Albright, Fred Shields, Will Wright, Stan Alexander, Peter Behn, Sam Edwards, Ann Gillis

Trilha Sonora: Frank Churchill e Edward H. Plumb

 

 

 

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Jonatas Rueda

Capixaba, formado em Direito e cinéfilo desde pequeno. Ama literatura e apenas vê séries quando acha que vale muito a pena. Além do cinema, também é movido à música, sendo que em suas playlists nunca podem faltar The Beatles, Bob Dylan, Eric Clapton e Led Zeppelin.

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