Horrorscópio | Os Outros (2001)
Lançado dois anos após O Sexto Sentido, poderia ter caído facilmente em um estilo clichê de suspense psicológico com uma reviravolta final; mas, assim como o clássico de Shyamalan, o que torna Os Outros um filme especial é sua capacidade de empilhar pistas e dicas de algo ainda não revelado, construindo cuidadosamente a tensão e nos levando ao final. O elemento do horror é mantido muito cauteloso e sutil, mas ainda assim se baseia nos medos do sobrenatural enquanto o faz. Muitas das questões invisíveis e sonoras ajudam a elevar essa noção, trazendo um medo crível dentro do personagem de Nicole Kidman, a protagonista Grace.
O filme é baseado em um livro de 1898, The Turn of the Screw, que já havia sido adaptado para o cinema em 1961 com Os Inocentes, estrelado por Deborah Kerr. Ambientado em 1945, evoca o período pós-guerra com muita eficácia e, embora a maioria das filmagens tenha sido feita na Espanha, a casa de estilo vitoriano parece britânica em todos os detalhes. Os móveis ornamentados e elegantes, os salões vazios e ecoantes, os trajes pálidos, as enormes janelas mostrando a parte externa e sua solidão quase apocalíptica.
A paleta visual é muito pálida para ressaltar a idade do ambiente, dos personagens e o sentimento de exaustão emocional. A fotografia de Javier Aguirresarobe, que mais tarde filmou A Estrada, contrasta o claro e o escuro a tal ponto que quase parece sépia, sugerindo as revelações arrepiantes que espreitam nas fotografias antigas.
Por causa de seu notável carinho pelas histórias clássicas de fantasmas, o diretor Alejandro Amenábar pinta nessa obra sinistra uma série de referências familiares; além das cenas panorâmicas que evocam O Iluminado, o uso do nevoeiro como ponto de encontro entre dois mundos se apoia não apenas em A Bruma Assassina, de John Carpenter, mas também no horror gótico A Mulher de Preto, de Susan Hill que é ambientado em uma casa isolada por pântanos, e a personagem principal aparece pela primeira vez envolta no denso nevoeiro.
Como em todos os grandes filmes de terror/suspense, o senso de questionamento precisa ser posto à prova para que possamos ficar em dúvida se os eventos sobrenaturais são reais ou efeito da imaginação de suas personagens. Nesse caso, além da presença das crianças, que podem estar lidando com amigos imaginários, a fita estabelece Grace como guia do público, usando seus valores rigorosos e seu senso de convicção para nos enervar. No primeiro ato, a personagem é definida como alguém completamente ordeira e no controle, mas quando os barulhos estranhos começam a ocorrer, experimentamos o processo de ver alguém enlouquecer ou o choque moral ao ver seus fortes valores sendo tão profundamente questionados.
Homenageando elegantes clássicos do cinema-fantasma, Amenábar planta a solidão do pós-guerra e a religiosidade agonizante diante de um cenário de sombras macabras e brumas claustrofóbicas. A gelada Grace se afunda em tormentos confusos dentro das paredes de sua mansão vitoriana labiríntica, protegendo seus filhos fotossensíveis da luz do sol que penetra pelas janelas cobertas de cortinas. O auxílio para seus temores vem na forma de três andarilhos: a governanta materna Sra. Mills (Fionnula Flanagan), o jardineiro Sr. Tuttle (Eric Sykes) e a jovem muda Lydia (Elaine Cassidy). As crianças solitárias, Anne (Alakina Mann) e Nicholas (James Bentley) se veem encapsulados na mansão melancólica que não parece oferecer nenhum tipo de alegria, e mesmo que a infância possa lhes abrir um pouco de esperança, o catolicismo fervoroso da mãe os mina de qualquer tipo de fantasia.
Nessa narrativa fantasmagórica, o filme entrega visões potentes sobre vida, morte e religião com uma reviravolta pouco original, mas que é cautelosamente desfragmentada durante a fita em pequenas pistas que funcionam como migalhas, nos guiando ao desfecho triste e transformador de suas personagens.
Avaliação do Clube: ★★★★✰
Nome Original: The Others
Ano: 2001
Direção: Alejandro Amenábar
Roteiro: Alejandro Amenábar, Sonia Grande
Elenco: Nicole Kidman, Fionnula Flanagan, Eric Sykes, Elaine Cassidy, Alakina Mann, James Bentley
Fotografia: Javier Aguirresarobe
Trilha sonora: Alejandro Amenábar